quinta-feira, 7 de março de 2013

Justiça Juvenil Francesa

 
 
A JUSTIÇA PENAL JUVENIL NA FRANÇA
 
O sistema penal juvenil francês, considerando as hipóteses do adolescente infrator e da criança ou adolescente em situação de risco, se baseia numa filosofia calcada em três elementos fundamentais:

a) Atuação paternalista dos juízes de menores;
b) Abordagem cada vez mais próxima entre as questões de proteção e recuperação do adolescente em conflito com a lei;
c) Prevalência da aplicação de medidas educativas, ao invés de medidas de caráter repressivo.
 
A figura principal neste sistema penal juvenil é o Juizado da Criança, vez que se encontra presente em todo o processo que envolve a criança ou o adolescente, inclusive na fiscalização das medidas judiciais que foram aplicadas em cada caso. Sua atuação envolve as questões penais e civis.
O sistema francês entende que os mesmos princípios aplicados ao adolescente infrator também devem ser aplicados àqueles que se encontram em situação de risco, razão pela qual as medidas de caráter educativo são prioritárias (medidas excepcionais somente são aplicadas em casos graves – natureza do delito – ou em face da prática de atos infracionais reincidentes).

A maioridade penal
 
A responsabilidade penal referente à prática de atos infracionais por crianças e adolescentes se estende até os 18 anos. Entretanto, a legislação em vigor entende que a criança com idade superior a sete anos já pode ser responsabilizada pela prática de atos ilícitos (há projeto alterando esta concepção para que a responsabilização passe a ser a partir dos 10 anos de idade).

Os crimes
 
O juizado da Criança considera para a aplicação das medidas ao adolescente ou criança em conflito com a lei, a mesma tipificação dos crimes que se aplicam aos maiores de 18 anos. Consideram, entretanto, uma diferenciação entre faltas e crimes (delitos leves ou graves). Esta diferenciação é fundamental para que o sistema judicial francês determine a competência jurisdicional do juízo que deverá apreciar cada caso.
Cabe destacar que a Jurisdição Especializada de Menores é o órgão competente para conhecer dos atos infracionais cometidos pelo adolescente ou criança em conflito com a lei, bem como para conhecer os casos de proteção.
Este juízo especializado possui três níveis de competência que são determinados em função da gravidade e circunstâncias do ato delitivo:
a) Juízo para crianças;
b) Tribunal de Menores, composto por um juiz e assessores;
c) Seção de Menores para audiências criminais, composta por dois juízes e um júri de nove cidadãos designados por sorteio.
A jurisdição se dá por meio do local do delito, pela residência habitual da criança ou do menor em conflito com a lei ou pelo local da detenção pela prática do ato infracional. Trata-se de uma pluralidade de critérios que vem facilitando a apreciação dos atos infracionais junto ao juízo mais próximo do menor de idade.
Dos procedimentos da Polícia
 
Diverso do que ocorre no Brasil, a Brigada de Menores da Polícia Francesa ao deter um menor com “idade penal”, inicia uma “investigação preliminar” para reunir os primeiros elementos de prova e das circunstâncias do evento.
Há algumas garantias que devem ser observadas pela polícia, destaco:
a) Obrigação de informar aos pais (ou tutores) sobre a detenção do menor;
b) Presença dos responsáveis durante o “interrogatório” do menor detido;
c) Evitar atos que possam “impressionar” o menor infrator;
d) Devolução do menor infrator à guarda dos responsáveis (para os casos de menor gravidade);
e) Possibilidade de detenção preventiva durante 24 horas, na própria delegacia, na situação em que o menor infrator seja perigoso, se o fato for grave, se houver a possibilidade de não comparecer posteriormente em juízo (nos casos graves, a detenção preventiva pode ser prorrogada por mais 24 horas pela autoridade superior - fiscal).
 
Terminado a investigação preliminar, o menor é encaminhado a um fiscal (que funciona como um acusador público e decide qual juízo irá apreciar o caso) que irá qualificar o ato. Caso não existam provas suficientes contra o menor infrator e não seja possível realizar novas diligências, o caso é arquivado sumariamente (pode ser reaberto diante da produção de novas provas).
Se a falta cometida pelo menor infrator não for grave, ele será conduzido a um Tribunal Correcional. Se a falta for grave ou for um crime, ele será conduzido diante de um Juiz de Menores que atuará no processo antes do Juiz de Instrução (este é competente para apreciar casos graves ou complexos e aqueles em que exista coautoria com maiores de idade).
Na fase de instrução (sobre os fatos e personalidade do menor infrator) o juiz esta obrigado a observar as normas processuais. É obrigatório que se efetue investigações quanto a personalidade do menor, que se verifique as condições socioeconômicas da família, que se faça um exame médico-psicológico (ele deve ser submetido a testes psicológicos) e que o menor seja entrevistado por educadores do serviço de educação do Tribunal.
Ainda na instrução, o juiz (de menores ou de instrução), conforme o caso, é obrigado a ouvir o menor, explicar do que esta sendo acusado, informar sobre seu direito a informar a família e de constituir um advogado (ou se beneficiar da justiça gratuita).
Nos crimes considerados graves e quando o menor possui mais de 16 anos, os autos são remetidos para a Seção de Menores – Audiência Criminal. Prevalece o sigilo dos fatos (não há publicidade). Interessante é que o juiz se despe da Toga para não impressionar o infrator. Nesta ocasião, iniciam-se os debates, privilegiando o diálogo entre o menor, seus pais, tutores, advogados e educadores.
A sentença judicial deve ser precedida de um “diagnóstico educativo” proposto pelo Serviço de Educação do Tribunal (SEAT) que indique a personalidade do menor infrator, uma proposta de medida educativa (se possível – para evitar a aplicação de uma sanção de natureza privativa de liberdade).
Após a produção das provas, recebimento dos laudos do SEAT e resultado das diligências e estando os autos conclusos, o juiz decide.
A sentença, quando aplica uma medida preventiva, pode:
a) Para os maiores de 16 anos pode ser aplicada a “prisão preventiva” (proteção judicial que equivale a internação);
b) Obrigações comunitárias e proibições (o controle do cumprimento das obrigações e fiscalização das proibições é feito pelo SEAT e, se desrespeitadas, a prisão preventiva pode ser aplicada);
c) Uma espécie de liberdade vigiada (controlada por um educador);
d) Medidas estritamente educativas (entrega a guarda dos pais, ao um tutor, a um terceiro ou internação em estabelecimento educativo).
 
Estas medidas podem ser modificadas a qualquer tempo pelo juiz competente, em função da evolução do caso e das informações do SEAT. Todas medidas aplicadas devem apresentar um “termo final” (prazo de duração) e devem estar de acordo com as leis (princípio da legalidade).
Se o menor tiver entre 13 e 16 anos, o juiz fica obrigado a aplicar a atenuante de “menor de idade”, o que representa expressiva redução de tempo na sanção (se o menor tiver entre 16 e 18 anos, esta atenuante é de aplicação facultativa).
Cabe salientar que a medida de liberdade vigiada pode se estender, no máximo, até a maioridade (18 anos) e pode vir acompanhada de outras obrigações (frequência escolar, proibição de frequentar determinados lugares etc.).
Caso todas as medidas aplicadas sejam insuficientes, o Poder Judiciário recorre as medidas sancionatórias previstas no Código Penal Francês, inclusive com cumprimento nos estabelecimentos prisionais destinados aos adultos.
O cumprimento das medidas devem ser acompanhadas pelo Judiciário que tem a obrigação de fazer os devidos ajustes. Há na França enorme quantidade de meios disponíveis para o cumprimento das penalidades socioeducativas (casas de crianças, casas educativas, família para acolher os menores, centros de estadia para finais de semana etc.).
Os “antecedentes criminais” dos menores infratores não ficam a disposição das polícias, apenas do judiciário.

A POLÍCIA
 
A polícia francesa conta com uma Brigada de Menores, especializada em lidar com menores infratores. São treinados e devem possuir conhecimentos jurídicos, psicologia, pedagogia etc. Possui um poder de polícia capaz de impor uma detenção preventiva de até 24 horas para o jovem infrator com mais de 16 anos.

SERVIÇO EDUCATIVO DO TRIBUNAL
 
Além de fiscalizar o cumprimento das sentenças proferidas, o SEAT é responsável pela elaboração de estudos, apreciação de estatísticas, formação dos delegados de liberdade vigiada e das equipes de apoio. Pode colocar em práticas programas experimentais, coordenar os órgãos públicos e privados nos assuntos que se relacionam com a criminalidade juvenil. Além disso, podem promover seminários e congressos temáticos.
É geralmente composto por educadores formados em Ciências Humanas.
Sua missão principal é propor medidas alternativas que possam evitar a internação do menor infrator.
ATUAÇÃO GOVERNAMENTAL
 
Nos anos 80, o governo Francês iniciou uma série de ações com objetivo de evitar a evasão escolar e minimizar as desigualdades sociais por meio da adoção de programas de ajuda econômica e de prevenção ao analfabetismo. Criou-se as Zonas de Educação Prioritária (ZEP).
Outrossim, estabeleceu-se o conceito inglês de “Community Service Order”, onde uma pena alternativa a prisão não substitui as medidas educativas. As penas alternativas vão de 20 a 120 horas de trabalhos comunitários, as quais devem ser efetivamente cumpridas dentro do prazo de um ano.
 

Um comentário:

  1. Olá, você poderia indicar uma fonte onde eu possa me aprofundar mais acerca desse assunto?

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