sábado, 5 de julho de 2014

Adolescente em Conflito com a Lei - Policiamento Comunitário X Mediação de Conflitos





Resumo

A Polícia Militar, por força constitucional, é a responsável pela preservação da ordem pública. Trata-se de uma atividade que transita entre a salubridade, tranquilidade, segurança e respeito da dignidade da pessoa humana. Nestas duas últimas áreas, sua atuação se faz na prevenção e repressão da prática do crime. O que se discute neste artigo é a possibilidade, mesmo sem previsão legal, do uso da mediação de conflitos como forma de evitar a prática de atos infracionais, ou seja, o controle do Estado sem a aplicação de penas privativas de liberdade em determinados atos infracionais, dentro da filosofia de policiamento comunitário.

Palavras-Chave: Adolescente em conflito com a lei. Policia Militar. Policiamento Comunitário. Mediação de Conflitos.

Abstract

The Military Police, by constitutional force, is responsible for the maintenance of public order. This is an activity that moves between health, tranquility, security and respect for human dignity. About security and respect for human dignity, their performance it by the prevention and repression of the crime. The discussion in this article is about the possibility, even without legal provision, of using conflict mediation as a way to avoid the commission of illegal acts, ie, the control of the state without the application of sentences involving deprivation of liberty for certain offenses, within the philosophy of community policing.

Keywords: Adolescents in conflict with the law. Military Police. Community Policing. Conflict Mediation.



1.             A POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO

O Estado Brasileiro se organizou para que todos os seus esforços protegessem a dignidade da pessoa humana. Trata-se de um princípio constitucional que deve balizar qualquer atividade estatal, incluindo a policial (AMORIM, 2009, p. 44-45).

Cumprindo dispositivo constitucional, o Brasil organizou seu sistema de segurança pública com base no artigo 144 da Carta Magna de 1988. Está definido que a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio é direito de todos, mas dever do Estado e de qualquer cidadão. Não há dúvida, portanto, que a segurança pública (em quaisquer de seus aspectos) e a paz social devem ser construídas com a participação de todos.

A participação efetiva do Estado neste processo de construção da paz social é o eixo norteador e fundamental, tanto que o artigo constitucional citado enumera as forças públicas que integram o sistema responsável pela promoção da segurança, sempre na busca do bem comum:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares. (grifo nosso)

Em seu parágrafo 5º, o artigo 144 confere expressamente as polícias militares estaduais as atividades de “polícia ostensiva e a preservação da ordem pública, nos Estados”. Amorim (ob cit., p. 91) apresenta que “em linhas gerais, a Constituição delineia a competência das Polícias Militares para o exercício da polícia ostensiva e a preservação da ordem pública”. Configura-se, assim, a principal responsável pelo processo de preservação da ordem pública.

Lazzarini (1989, ALVARO apud AMORIM, ob cit., p. 92-93), ao tratar da importância da polícia 
militar no processo de busca do bem comum, deixa claro ser ela a receptora de competência residual[1], ou seja, ela recebe a incumbência de exercitar ”toda atividade policial de segurança pública não atribuída aos demais órgãos”. Trata-se da:

[...] proteção às pessoas físicas e ao povo, seus bens e atividades, há de ser exercida pela Polícia Militar, como polícia ostensiva, na preservação da ordem pública, entendendo-se por polícia ostensiva a instituição policial que tenha o seu agente identificado de pleno, na sua autoridade pública, simbolizada na farda, equipamento, armamento ou viatura. (LAZZARINI, 1989 apud AMORIM, ob cit., p. 93)

Em nível estadual, seguindo o regramento constitucional da República Federativa, São Paulo por meio de sua Constituição (1989) estabeleceu:

Artigo 139 - A Segurança Pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e incolumidade das pessoas e do patrimônio.

Artigo 141 - A Polícia Militar, órgão permanente, incumbe além das atribuições definidas em lei, a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública. (grifo nosso)

Assim, a ordem pública é mantida, nos estados, a partir da atuação dos servidores públicos (instância formal) e de qualquer outra instituição (família, igreja, escola, organizações não-governamentais, mídia etc.) na instância informal (MARCINEIRO, 2009, p. 63), em face da responsabilidade atribuída a todos pela carta Magna. É necessário que aqueles que atuam nas instâncias formal ou informal tenham uma visão sistêmica e holística desta questão. Não há como preservar a ordem pública sem a participação de toda sociedade.

Para executar as atividades de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública, as polícias “condicionam e restringem o uso e gozo de certas atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado (MEIRELLES, Hely Lopes, 1995 apud AMORIM, ob cit., p. 53). Trata-se do exercício do poder de polícia, definido no artigo 78 do Código Tributário Nacional como:

[...] a atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando o direito, interesse ou liberdade, regula a prática de fato ou abstenção de ato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais e coletivos. (grifo nosso)

As polícias militares, portanto, devem se apropriar do poder de polícia de forma preventiva, deixando a utilização de atividades repressivas apenas para os casos em que a prevenção não atingiu seu objetivo. É seu objetivo garantir a convivência social (MARCINEIRO, ob cit., p. 61).

Resta concluir que constitucionalmente a Polícia Militar do Estado de São Paulo (PMESP) é a responsável pela proteção dos direitos individuais, do bem-estar coletivo e da ordem pública, pela promoção da paz social de forma a garantir a vida harmoniosa na comunidade e a proteção da dignidade da pessoa humana, no território paulista.

Neste diapasão, as polícias militares buscam exercer seu poder de polícia, de forma preventiva, na busca de evitar a eclosão de delitos que possam interferir na segurança e tranquilidade pública (compete também as polícias militares adotar medidas de prevenção da prática de atos infracionais, mormente que estes também exercem influência na percepção de segurança).

Para alcançar tais objetivos, além das atividades de polícia ostensiva desenvolvidas diuturnamente, a PMESP regulamentou programas de policiamento por meio de uma norma interna. São as Normas para o Sistema Operacional de Policiamento (NORSOP, 2006, p. 10) que determinam o objeto da atividade de polícia, resumidamente descritas por Paulino (2010, p. 30-31):

Programa de Policiamento Escolar: atividade ostensiva, realizada por meio da Ronda Escolar, voltada à segurança dos estabelecimentos de ensino, de modo a satisfazer as demandas de segurança da comunidade escolar;

Programa de Policiamento Integrado: é aquele onde um policial militar guarnece uma viatura, que atua de forma preventiva em pontos de estacionamento de maneira que possa ser visto e localizado com facilidade pelo cidadão;

Programa de Forças Táticas: atividade de policiamento especializado, executado com treinamento para atuar em situações específicas, em razão de certas peculiaridades da região, considerando o índice de criminalidade, tais como prevenção setorizada, repressão ao crime organizado ou em locais com alto índice de crimes violentos, ocorrências de vulto, eventos de importância, controle de tumultos e ações para restauração da ordem pública de maior magnitude;

Programa de Radiopatrulha: voltado ao atendimento das demandas feitas pela população, por meio do telefone de emergência da Polícia Militar “190”, e à realização do patrulhamento preventivo nos subsetores determinados;

Programa Policiamento com Motocicletas: Programa ROCAM: empregado principalmente nos grandes corredores de trânsito dos municípios mais populosos e nas Áreas de Interesse de segurança pública dos municípios do Estado (AISP), segundo a análise e estudo das variáveis indicadoras de criminalidade – sistema de Informações Criminais (INFOCRIM), base informatizada de Fotografias Criminais (FOTOCRIM), Sistema Informatizado de Administração Geoprocessada de Policiamento Ostensivo em Tempo Real (COPOM ON-LINE) e outras, como reportagens veiculadas na imprensa, informações obtidas junto à comunidade etc., de maneira que se possa permitir o acompanhamento e mensuração da sua eficácia em períodos pré-estabelecidos;

Programa de Policiamento Comunitário: objetiva organizar o policiamento realizado mediante o uso de Base Comunitária de Segurança (BCS), Posto Policial Militar (PPM), Base Comunitária de Segurança Distrital (BCSD), Base Operacional (B Op) e Base Comunitária Móvel (BCM), considerando ainda as viaturas de apoio a este Programa, destinadas às BCS e BCSD.

Programa de Policiamento de Trânsito: voltado a prevenir e reprimir atos relacionados com a segurança pública e de garantir obediência às normas relativas à segurança nas vias, assegurando a livre circulação e evitando acidentes. Atende aos municípios através de convênio. (SANTANA, 2010, p. 93)

Todos estes programas apresentam interface com as atividades que se destinam à prevenção da prática de crimes e de atos infracionais, mas é o policiamento comunitário que permite o envolvimento da comunidade e se relaciona diretamente com a doutrina de proteção integral[2].  

Alinha-se ao princípio de que as medidas privativas de liberdade para os autores de ato infracional devem ser exceção, num modelo que se opõe a “política de encarceramento como forma de lidar com a criminalidade e a violência dos adolescentes”. (PAULA, 2008, p. 33)

1.1. A filosofia de policiamento comunitário na Polícia Militar Paulista

Reis (2009, p. 47) anota que a filosofia de Polícia Comunitária tem origem na Inglaterra do século XIX, ocasião em que Sir Robert Peel, pressionado pelo aumento da criminalidade que ameaçava o comércio em Londres (1829), organizou uma força policial lastreada nos princípios relacionados a seguir (LIBÓRIO NETO, 1998 apud REIS, ob cit., p. 47-48), os quais deram origem teórica ao modelo comunitário:
·           A polícia deve ser estável, eficaz e organizada militarmente, debaixo do controle do governo;
·           A missão básica para a polícia existir é prevenir o crime e a desordem;
·           A capacidade da polícia realizar suas obrigações depende da aprovação pública de suas ações;
·           A polícia necessita realizar a segurança com o desejo e cooperação da comunidade, na observância da lei, para ser capaz de realizar seu trabalho com confiança e respeito do público;
·           O nível de cooperação do público para desenvolver a segurança pode contribuir na diminuição proporcional do uso da força;
·           O uso da força pela polícia é necessário para manutenção da segurança, devendo agir em obediência à lei, para a restauração da ordem, e só usá-la quando a persuasão, conselho e advertência forem insuficientes;
·           A polícia visa a preservação da ordem pública em benefício do bem comum, fornecendo informações à opinião pública e demonstrando ser imparcial no cumprimento da lei;
·           A polícia sempre agirá com cuidado e jamais demonstrará que se usurpado poder para fazer justiça;
·           O teste da eficiência da polícia será pela ausência do crime e da desordem, e não pela capacidade de força de reprimir esses problemas;
·           A Polícia deve esforçar-se para manter constantemente com o povo, um relacionamento que dê realidade à tradição de que a polícia é o povo e o povo é a polícia. (grifos nosso)

Verifica-se, assim, que a polícia deve estar ao lado da comunidade para que seja possível diminuir a incidência criminal praticada por adultos ou por adolescentes, bem como deve usar a força somente como exceção (o encarceramento não pode ser, portanto, a forma principal de combater o crime).

Brandão (AILTON ARAUJO; 2004 apud REIS, ob cit., p. 48) ensina que a filosofia de polícia comunitária foi introduzida no Brasil no final da década de 1980 (e início dos anos 90). No estado de São Paulo, os estudos de implantação se iniciam em 1993 e se solidificam em 1997, momento em que a sociedade paulista foi chamada a participar da construção da paz social, formando a parceria estratégica proposta pela doutrina (TROJANOWICZ; BUCQUEROUX, 1999, p. 4-5).

Trajanowicz e Bucqueroux (ob cit., p. 4) definem o policiamento comunitário como “uma filosofia e uma estratégia organizacional, que conduz a uma integração entre a população e a polícia, no qual a comunidade e a polícia, de comum acordo, identificam e trazem soluções adequadas aos problemas que impactam a segurança pública, propiciando uma vida saudável em sociedade”. Marcineiro (ob cit., p. 70) o define como “um conceito de segurança pública que se baseia na interação constante entre a corporação policial e a população”. Para Wadman (1994 apud MARCINEIRO, ob cit., p. 114) policiamento comunitário “é uma maneira inovadora e mais poderosa de concentrar as energias e os talentos do departamento policial na direção das condições que frequentemente dão origem ao crime e a repetidas chamadas por auxílio local”. Skolnick e Bayley (2006, p. 119) ensinam que “o policiamento comunitário é a nova filosofia de policiamento profissional nas democracias industriais do mundo”.

[...] o policiamento comunitário gera segurança pública e diminui as taxas de criminalidade, reduz o medo do crime e faz o público se sentir menos desamparado, refaz a conexão da polícia com públicos desinformados, levanta o moral policial, e torna a polícia mais sujeita a prestação de contas (SKOLNICK; BAYLEY, ob cit., p. 119)

Beato (2000 apud MARCINEIRO, ob cit., p. 95) afirma que a ideia central da “Polícia Comunitária reside na possibilidade de propiciar uma aproximação dos profissionais de segurança junto à comunidade onde atua”.

A filosofia de policiamento comunitário exige que o policial militar esteja comprometido com seu trabalho e que esteja disposto a assumir responsabilidades, pois uma de suas vertentes é a descentralização do poder decisório (empoderamento) de forma a permitir autonomia e liberdade em solucionar problemas locais, o que pode ser feito por meio do procedimento de mediação. Neste sentido, o policial militar deve agir como um “chefe de polícia local”, com liberdade para tomar decisões dentro de sua competência funcional:

O policiamento comunitário baseia-se também no estabelecimento dos policiais como “mini-chefes” de polícia descentralizados em patrulhas constantes, onde eles gozam da autonomia e da liberdade de trabalhar como solucionadores locais dos problemas da comunidade, trabalhando em contato permanente com a comunidade – tornando as suas comunidades locais melhores para morar e trabalhar. (TROJANOWICZ; BUCQUEROUX, ob cit., p. 4-5)

Desde 1997 a PMESP insere em seu contexto operacional, como filosofia de trabalho, a polícia comunitária (NORSOP, 2006, p. 2):

A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é um sistema que tende a ser mais eficiente quando, além de contar com maior interação de todos os órgãos que o integram, passa a dispor também da efetiva colaboração da sociedade, que deve ser estimulada a participar do processo de formação de idéias e propostas que busquem propiciar mecanismos voltados ao controle e/ou redução dos indicadores de ilegalidade, diminuindo a violência e a perda de vidas e bens, melhorando os níveis de preservação da ordem pública e, conseqüentemente, melhorando a qualidade de vida. Esta interação é característica marcante da Polícia Comunitária, que é uma filosofia e uma estratégia institucional. Enquanto filosofia deve permear todos os níveis e ser absorvida por todos os membros da Instituição Policial-Militar. Enquanto estratégia deve direcionar todos os esforços, medidas e programas institucionais, nos diversos níveis gerenciais, no sentido de criar condições para que a Instituição aproxime-se de seu público externo, manifesto pelas diversas comunidades, dele obtendo respaldo, cooperação, parceria, participação e informações que contribuam para a preservação da ordem pública, para a obtenção do grau de segurança pública desejado e aceitável e para a melhoria da qualidade de vida do ambiente. (sic) (grifo nosso)

Não há dúvida de que o policiamento comunitário é a forma pela qual a PMESP pode buscar a resolução preventiva de problemas, como uma nova estratégia operacional. Ademais é ainda pertinente destacar que a filosofia de polícia comunitária prescreve que grupos com necessidades específicas devem ter atenção especial da polícia, dos quais se destaca o grupo de adolescentes que devem ser observados a partir da doutrina de proteção integral. “Lidar com a juventude constitui uma atividade especial da polícia (BITTNER, 2003, p. 303).

1.2. A mediação de conflitos como alternativa de prevenção

O ordenamento constitucional brasileiro, no preâmbulo da Carta Magna, inscreve textualmente o processo pacífico de solução de controvérsias.

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias [...] (grifo nosso)

Lima (ANA PAULA CARVALHO DE; 2010 apud PAULINO, ob cit., p. 50) ressalta que o procedimento de mediação sempre foi utilizado pelas autoridades como forma de comunicação. Considera a possibilidade de existir conflitos com motivações diversas (costumes, língua, crenças, comportamentos etc.) e que a mediação se revestia numa ferramenta de retorno a convivência pacífica, pois as eventuais desavenças eram solucionadas.

Sampaio e Braga Neto (LIA REGINA CASTALDI; ADOLFO; 2007 apud REIS, 2009, p. 22) apresentam os métodos alternativos para resolução de conflitos:

·           Negociação: considerado como o instrumento primeiro e natural para solucionar os conflitos, a negociação se faz apenas entre os atores envolvidos na controvérsia, que recorrem ao diálogo e a troca de opiniões e impressões, não havendo a participação de terceiros. Uma vez que a solução atenda ambas as partes, o conflito estará resolvido;
·           Arbitragem: é um meio de solução de controvérsias, atinente a direitos patrimoniais disponíveis, no qual ocorre a intervenção de um terceiro independente e imparcial, que recebe de uma convenção denominada arbitral, poderes para decidir por ela, sendo sua decisão equivalente a uma sentença judicial. O compromisso arbitral é a convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem de uma ou mais pessoas, podendo ser judicial ou extrajudicial. No Brasil, a arbitragem foi regulamentada através da Lei 9.307/96, que deu grande impulso a esta forma de solução de conflitos que, entre outros benefícios dispensou a homologação judicial da sentença arbitral, que passou a ter a mesma eficácia que da sentença judicial. Cabe salientar que a lei permite em três momentos específicos a possibilidade de as partes se entenderem e se conciliarem durante o processo. Tal fato oferece um enfoque menos formal e privilegia o princípio da autonomia das vontades. Ao mesmo tempo promove a pacificação dos contendores e a possibilidade de utilizarem um momento de tentativa de composição entre si;
·           Conciliação: este instituto é frequentemente confundido com a mediação e, por muitas vezes, os dois são considerados sinônimos, pois há muito desconhecimento sobre as características particulares de cada um. A distinção entre ambos passa, inicialmente, pela abordagem do conflito. A conciliação é um procedimento mais célere e, na maioria dos casos, restringe-se a uma reunião entre as partes e o conciliador. Para que haja a conciliação é preciso que não haja entre as partes um relacionamento significativo passado ou possibilidade no futuro. É o que ocorre, por exemplo, em um acidente de trânsito sem vítimas, em que as partes somente necessitam de que um terceiro as ajudem a encontrar a melhor solução para a controvérsia e se vale a pena procurar por uma solução litigiosa. O Código de Processo Civil Brasileiro (1973) estabelece que o juiz deve tentar compor as partes antes de tomar uma decisão. Para alguns autores o conciliador pode apresentar sugestões, tomando-se o cuidado de destacar que elas nunca são impositivas ou vinculadas, pois seu objetivo é evitar os desgastes de uma batalha judicial;
·           Mediação: a atividade de mediação de conflitos é um método de resolução de conflitos em que um terceiro, independente e imparcial, coordena reuniões conjuntas ou separadas com as partes, com o objetivo, dentre outros, de promover o diálogo entre elas a fim de possibilitar maior reflexão sobre suas questões, com vistas à construção de soluções. A mediação não busca pura e simplesmente um acordo, mas atingir a satisfação dos interesses e das necessidades dos envolvidos. Nessa modalidade de resolução de conflitos as sugestões não são bem vindas, pois o mediador encontra-se em um nível superior ao das partes que, naquele momento não conseguem enfrentar as dificuldades em gerir e resolver o conflito. A mediação difere da conciliação por que está direcionada àquelas partes que possuem anos ou décadas de relacionamento e demanda, da parte do mediador, conhecimento mais profundo sobre a inter-relação entre as partes.

É a mediação a forma adequada para lidar com os conflitos que envolvem os adolescentes em conflito com a lei, pois se enquadra perfeitamente na doutrina de policiamento comunitário, razão pela qual é apresentada como uma ferramenta de prevenção a ser utilizada pela PMESP nos atos infracionais que podem ser considerados de menor gravidade.

Sales (LILIA MAIA DE MORAIS; 2007 apud REIS, ob cit., p. 23) adverte que a mediação, por ser uma forma participativa de solução de conflitos, exige das partes envolvidas uma discussão sobre “problemas, sobre os comportamentos, sobre os direitos e deveres de cada um – todo este diálogo realizado de forma cooperativa, fortalecendo o compromisso ético com o diálogo honesto”. A mediação, portanto, é capaz de apresentar ao adolescente em conflito com a lei a possibilidade de refletir sobre sua ação a partir da ética, identificando quais direitos foram violados e quais as consequências deste ato.

Vasconcelos (CARLOS EDUARDO; 2008 apud REIS, ob cit., p. 24) ensina que este processo de mediação é construído a partir da existência da vontade das partes em encontrar uma solução para o conflito e sempre deve ser mediado:

A mediação é um meio geralmente não hierarquizado de solução de conflitos em que duas ou mais pessoas, com a colaboração de um terceiro, o mediador, expõem o problema, são escutadas e questionadas, dialogam construtivamente e procuram identificar os interesses comuns, opções e, eventualmente, firmar um acordo. Os mediandos não são adversários, mas co-responsáveis pela resolução da disputa. (grifo nosso)

Reis (ob cit. p. 25) destaca que o principal objetivo da mediação “é facilitar o diálogo entre as partes, de forma que estas identifiquem os reais problemas que estão afetando a relação e reconheçam a legitimidade dos interesses de cada um dos envolvidos, fator fundamental para que os conflitos sejam solucionados de forma duradoura e benéfica para todos seus atores”. É por meio desta solução duradoura dos conflitos que pode-se entender que a paz social pode ser alcançada de forma mais preventiva do que repressiva, razão pela qual esta atividade encontra possibilidade de ser incluída dentro da estratégia de atuação da PMESP. Paulino (ob cit., p. 50) aponta exatamente esta possibilidade:

Dentro de uma política de prevenção à criminalidade, a mediação de conflitos é um instrumento de qualificação e modernização das polícias brasileiras. Apresenta-se não apenas como um método de resolução pontual, mas como uma forma de efetivação da democracia e busca pela paz social, que prioriza as relações sociais e o convívio harmônico das partes, possibilitando que os envolvidos possam restabelecer suas relações interpessoais e assim contribuir para a melhoria das relações comunitária. (grifo nosso)

Trata-se, assim, de uma evolução da polícia tradicional para a polícia cidadão (de difícil, mas possível, transposição), conforme anotado por Bengochea (2004):

O grande desafio colocado no processo de democratização dos países da América Latina, hoje, quanto às organizações policiais, é a questão da função da polícia, do conceito de polícia. Esta definição é manifestada pela transposição da polícia tradicional, voltada exclusivamente a uma ordem pública predeterminada e estabelecida pelo poder dominante, para uma polícia cidadã, direcionada para efetivação e garantias dos direitos humanos fundamentais de todos os cidadãos.

O policiamento comunitário busca a preservação da dignidade da pessoa humana como elemento indispensável para que a ordem pública seja preservada. Silva (JORGE DA; 2008 apud REIS, ob cit. p. 45) explica em sua obra que esta mudança leva a polícia a se transformar em elemento de proteção da cidadania (alinhada, assim, na doutrina de proteção integral que lastreia o Estatuto da Criança e do Adolescente):

A polícia de hoje deve ter um papel diferente do de fazer somente cumprir a lei e manter a ordem na base da força. Ela deve ser encarada como um serviço público essencial, a disposição da população. Esta concepção é diametralmente oposta à concepção tradicional, pois muda o destinatário da ação da polícia, fazendo prevalecer o conceito de proteção sobre o de repressão. Agora o destinatário do serviço policial vai ser a população como um todo, que vai contar com estes serviços para orientá-la, ajudá-la e protegê-la contra os criminosos certos e determinados.

Bengochea (ob cit.) explica que é possível ter uma polícia diferente numa sociedade democrática e que infere ser possível apresentar um olhar da polícia com muito mais vontade de prevenir a eclosão do ato infracional do que partir em busca da apreensão e do encarceramento. Segundo o autor, a polícia pode em sua atividade preventiva se aproveitar da ferramenta da mediação de conflitos:

A concretização dessa possibilidade passa por alguns eixos. Primeiro, por mudanças nas políticas de qualificação profissional, por um programa de modernização e por processos de mudanças estruturais e culturais que discutam questões centrais para a polícia: as relações com a comunidade, contemplando a espacialidade das cidades; a mediação de conflitos do cotidiano como o principal papel de sua atuação; e o instrumental técnico e valorativo do uso da força e da arma de fogo. São eixos fundamentais na revisão da função da polícia. (grifo nosso)

Esta disposição preventiva pode ser mais percebida quando a polícia muda sua estratégia operacional ao incorporar a filosofia de policiamento comunitário na busca de “soluções ou alternativas para equacionar ou amenizar problemas relacionados a criminalidade, violência e à desordem” (MARCINEIRO, ob cit., p. 119). Bengochea (ob cit.) ainda acrescenta que a negociação deve ser o principal instrumento de prevenção:

No modelo tradicional, a força tem sido o primeiro e quase único instrumento de intervenção, sendo usada frequentemente da forma não profissional, desqualificada e inconsequente, não poucas vezes à margem da legalidade. É possível, portanto, ter outro modelo de polícia, desde que se passe a centrar sua função na garantia e efetivação dos direitos fundamentais dos cidadãos e na interação com a comunidade, estabelecendo a mediação e a negociação como instrumento principal; uma polícia altamente preparada para a eventual utilização da força e para a decisão de usá-la. Tudo isso tendo como base políticas públicas que privilegiem investimentos na qualificação, na modernização e nas mudanças estruturais e culturais adequadas.

A Organização das Nações Unidas (ONU), por meio da Resolução n. 2002, de 24 de julho de 2012, recomenda a utilização da justiça restaurativa, com a implementação de medidas de mediação, para a segurança pública, com uma nova proposta de abordagem criminal. A resolução encoraja os Estados a adotarem a mediação como uma forma de prevenção para o crime e a compreende como uma resposta ao crime que “promove a harmonia social por meio da restauração das vítimas, ofensores e comunidades”. Neste sentido, a ONU entende que a mediação permite que as “pessoas afetadas pelo crime podem compartilhar abertamente seus sentimentos e experiências, bem como seus desejos sobre como atender às suas necessidades” e podem ser usados em qualquer “estágio da justiça criminal”. Com isto seria possível que a vítima obtivesse reparação do dano sofrido e se sentisse mais segura (SANTANA, 2010, p. 41-51).

Para a ONU o processo restaurativo significa:

[...] qualquer processo em que a vítima e o ofensor, e, quando apropriado, quaisquer outros indivíduos ou membros da comunidade afetados por um crime, participam ativamente na resolução das questões oriundas do crime, geralmente com a ajuda de um facilitador. Os processos restaurativos podem incluir a mediação, a conciliação, a reunião familiar ou comunitária (conferencing) e os círculos de sentença (sentencing circles). (SANTANA, ob cit., p. 45)

Claro, portanto, que a mediação de conflitos se apresenta como uma ferramenta de prevenção da prática de atos infracionais. Entretanto, em face da ausência de norma legal que regulamente esta atividade, faz-se necessária uma reflexão sobre em que limite a mediação comunitária poderia ser efetivada pela PMESP sem que exista prevaricação ou abuso de poder.

Reis (ob cit., p. 44) discutiu a possibilidade da PMESP intervir nos conflitos que ocorrem na comunidade, utilizando-se das técnicas de mediação. Encontrou fundamentação constitucional ao perceber no texto jurídico os fundamentos do estado democrático de direito:

A Constituição Federal de 1988 traz em seu artigo 1º os fundamentos do estado democrático de direito que são a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político, contemplando como objetivos fundamentais a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a garantia do desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Deve-se, neste momento, remeter a interpretação para o artigo 144 da Carta Magna que especifica a missão das policiais militares na preservação da ordem pública. A ordem pública, por sua vez, diz respeito as condições de uma vida social saudável, com segurança das pessoas e do patrimônio público ou particular, da salubridade e tranquilidade pública[3].

Não há de se falar em melhoria da qualidade de vida da comunidade se existir ofenda a dignidade da pessoa humana. Assim, Marcineiro (ob cit., p. 81) aponta também que é necessário incluir como elemento da ordem pública a proteção da dignidade da pessoa humana, pois o uso do poder de polícia também deve ser usado para a preservação desta circunstância. É possível que a PMESP se aproveite da mediação de conflitos para promover a preservação da ordem pública e o policial pode servir como este facilitador. A ONU orienta que os:

Os estados membros devem buscar a formulação de estratégias e de políticas nacionais, objetivando o desenvolvimento da justiça restaurativa e a promoção de uma cultura favorável ao uso da justiça restaurativa pelas autoridades de segurança e das autoridades judiciais e sociais, bem como em nível das comunidades locais. (SANTANA, ob cit., p. 50)

Silva Junior (AZOR LOPES DA; 2009 apud REIS, ob cit., p. 54) também entende ser possível o emprego na mediação na esfera penal:

Na esfera do Direito Penal, todavia, a lei reserva espaços em que o direito de ação depende exclusivamente do ofendido, ainda que o direito de punir seja monopolizado pelo Estado.

Neste sentido, Reis (ob. cit., p. 45) relaciona a possibilidade de mediação de conflitos por parte da PMESP a conceituação do elemento tranquilidade pública, exemplificando com as situações de “pública os estados de “[...] quietude, ordem, silêncio, a normalidade das coisas que [...] não transmitem nem provocam sobressaltos, preocupações e aborrecimentos [...]”. São situações que representam a cristalização do conceito de menor potencial ofensivo. Surge desta forma um limite onde a mediação poderia se apresentar nas questões criminais que envolvem adolescentes em conflito com a lei.

Paulino (ob cit., p. 120) acrescenta outras possibilidades de atuação da PMESP, aproveitando-se da resolução de conflitos:

A mediação de conflitos pode ser aplicada tanto na resolução de pequenos conflitos, mormente, desavenças familiares, problemas entre vizinhos, etc., como em ocorrências mais graves, passíveis de repercussão, tais como: reintegração de posse, invasão de prédios públicos, estacionamentos irregulares em via pública que interferem a vida em comunidade, perturbação de sossego em área específica envolvendo vários atores (barzinhos, “bailes funks”), eventos culturais em área pública (ensaios de escola de samba, festas de bairros) entre outros problemas, que se não tratados previamente, poderão evoluir, chegando à eclosão de crises com a quebra da ordem pública, reflexos nefastos à imagem da Instituição Policial e danos à vida em sociedade.

Vasconcelos (CARLOS EDUARDO; 2007 apud REIS, ob cit., p. 54) também entende ser possível a aplicação do processo de mediação de conflitos nas infrações de menor potencial ofensivo:

A assunção, pela sociedade, do papel de protagonista na solução amigável ou arbitral de questões cíveis ou mediação de infrações penais de menor potencial ofensivo é o aspecto desse movimento de acesso à justiça que melhor reflete o desenvolvimento de uma consciência de cidadania ativa no jogo democrático conflituoso e pluralista.

Tal fenômeno não contraria o ordenamento jurídico estatal, a unicidade do direito enquanto ordenamento jurídico, o poder de império atribuído ao Estado. Em verdade, tal fenômeno revela uma complementação necessária, enquanto expressão do pluralismo da esfera pública fundante da própria ordem constitucional do Estado. É, pois, nessa área de possibilidade de consenso extrajudicial entre os sujeitos em conflito que é possível a mediação conduzida pelo agente policial bem preparado.

Outra possibilidade se apresenta para os conflitos de direitos disponíveis regulados por normas de 
Direito Civil e naqueles de ordem penal em que a ação penal seja privada, ou mesmo pública, desde que condicionada à representação do ofendido. O emprego de técnicas de mediação por policiais teria o condão de pacificar conflitos em sua flagrância, ao contrário da via judicial, notadamente mais tardia, por mais que se tente imprimir celeridade.

Sampaio e Braga Neto (LIA REGINA CASTALDI; ADOLFO; 2007 apud PAULINO, ob cit., p. 62-63) apontam mais áreas onde a mediação pode ser utilizada, das quais destaca-se:

·           Mediação familiar: utilizada para questões envolvendo conflitos familiares, proporciona soluções inovadoras e conduz ao resgate dos laços familiares e retorno da harmonia no lar; cabendo ao Estado dar atenção especial nessas questões, pois a família é a base da sociedade, devendo ser preservada.
·           Mediação trabalhista: utilizada para a gestão das relações capital/trabalho, procura o equilíbrio entre os dois pólos, por intermédio do diálogo mais aberto entre os protagonistas.
·           Mediação ambiental: utilizada para a gestão das questões ambientais, possibilita o diálogo entre os envolvidos e a conscientização ecológica dos atores, pelos compromissos assumidos ao longo do procedimento.
·           Mediação escolar: utilizada para a resolução de disputas e controvérsias nas escolas, permite maior comunicação entre os alunos, docentes, diretores coordenadores e pais, gerando melhor clima de convivência.
·           Mediação no terceiro setor: utilizada para a resolução de controvérsias entre as entidades e o voluntariado, possibilita a reflexão sobre os objetivos do trabalho, comprometendo o voluntariado com a filosofia contemporânea do terceiro setor.
·           Mediação comunitária: a mediação comunitária contribui para a criação de espaços de diálogos onde as pessoas transmitem suas diferenças e constroem de maneira participativa e pacífica seus lugares na sociedade.

Trata-se, assim, de uma série de oportunidades em que o policial pode promover a prevenção sem o uso da força do Estado encarcerador. Nassaro (2012, p. 69-78) identifica outras possibilidades do uso da mediação no policiamento preventivo:

·           Acidentes de trânsito sem vítimas (os prejuízos materiais decorrentes de acidentes de trânsito sem vítima não configuram a infração penal de “dano” (este sempre doloso, do art. 163 do Código Penal) e, portanto, são considerados ilícitos civis);
·           Outros prejuízos e danos materiais - ilícitos civis e danos simples (os que decorrem da destruição, inutilização ou deterioração de coisa alheia por culpa - imprudência, imperícia ou negligência - passíveis de indenização ou ressarcimento - novamente, o ilícito civil não se confunde com o dano do art. 163 do CP, em que se exige o dolo). São situações que geram conflitos;
·           Contravenções penais;
·           Divergência entre vizinhos e desinteligências em geral (ex.: barulho, perturbação do sossego, ofensas ao direito de vizinhança, colocação indevida de lixo etc.);
·           Lesão corporal leve ou culposa (delito de menor potencial ofensivo);
·           Demais infrações de menor potencial ofensivo;
·           Infrações penais de ação penal privada. (grifo nosso)

Parece, portanto, que a ferramenta de mediação pode evitar o encarceramento de jovens quando praticam atos infracionais que correspondem aos delitos de menor potencial ofensivo ou daqueles cuja ação penal dependa da queixa ou representação do ofendido.

2.             Considerações Finais

O uso da mediação de conflitos não é uma novidade nas políticas de prevenção da violência. A ONU, em abril de 2005, durante o 11º Congresso sobre Prevenção do Crime e Justiça Criminal, editou a Declaração de Bangkok - Synergies and Responses: Strategic Alliance in Crime Prevention and Criminal Justice[4]. Esta declaração estabelece a preocupação com os adolescentes em conflito com a lei:

[...] Para promover os interesses das vítimas e de reabilitação dos agressores, Reconhecemos a importância de desenvolver políticas de justiça restaurativa, procedimentos e programas que incluem alternativas ao Ministério Público, como de evitar possíveis efeitos negativos da prisão, ajudando a diminuir o número de processos tribunais penais e a promover a incorporação de abordagens de justiça restaurativa em sistemas de justiça criminal, conforme o caso. Afirmamos a nossa determinação em prestar especial atenção à justiça juvenil. Vamos estudar formas de garantir a prestação de serviços às crianças, pois elas são vítimas da criminalidade e das crianças em conflito com a lei, em especial privadas da sua liberdade, e também para garantir que esses serviços tenham em conta seu sexo, suas circunstâncias sociais e as necessidades de seu desenvolvimento [...]. (SANTANA, ob cit., p. 52) (grifo nosso)

Destarte, o policial militar surge como um cidadão, como um líder, que no exercício da função de preservação da ordem pública e por estar próximo a comunidade, pode mediar os conflitos e encontrar com rapidez resolução que evite a intervenção da polícia judiciária e os processos judiciais. 

O policial militar, portanto, poderia mediar os conflitos que envolvem adolescentes nas situações de “problemas de convivência, atritos nos relacionamentos interpessoais e pequenas desordens”, ou seja, nos conflitos de natureza civil e na esfera penal, nos delitos de menor potencial ofensivo, conforme configuração prevista na Lei n. 9.099/95 (REIS, ob cit., 46).

Para a Corporação, a mediação de conflitos caracteriza mais uma ferramenta de prevenção que “possibilita resolver desavenças havidas no seio da comunidade e, por meio do diálogo, buscar uma solução suportável às partes, sem prejuízo a um ou a outro, contribuindo para uma cultura de paz” (PAULINO, ob cit., p. 68) e que pode ser incorporada a estratégia de policiamento comunitário.

Referências

AMORIM, Jorge Schorne de. Sistema Nacional de Segurança Pública. Palhoça: Unisul Virtual, 2009.
BENGOCHEA, Jorge Luiz Paz; GUIMARÃES, Luiz Brenner; GOMES, Martin Luiz; ABREU, Sérgio Roberto de. A transição de uma polícia de controle para uma polícia cidadã. Revista São Paulo em perspectiva, 2004.
BITTNER, Egon. Aspectos do trabalho policial. São Paulo: EDUSP, 2003.
BRASIL. Código Tributário Nacional. Disponível em: . Acesso em: 28 abr. 2014.
______. Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: . Acesso em: 28 abr. 2014.
FONSECA, Antonio Cezar Lima da. Direitos da criança e do adolescente. 2 ed. São Paulo: Atlas, 2012.
MARCINEIRO, Nazareno. Teoria de polícia comunitária. Palhoça: Unisul Virtual, 2009.
NASSARO, Adilson Luis Franco. O policial militar pacificador social: emprego da mediação e da conciliação no policiamento preventivo. Tese (doutorado em Ciências Policiais de Segurança e de Ordem Pública). São Paulo: CAES, 2012.
PAULA, Liana de; LIMA, Renato Sérgio de  et al. Segurança pública: o Estado está cumprindo seu papel? São Paulo: Contexto, 2008.
PAULINO, Carlos Alberto. Mediação de conflitos: proposta de uma estratégia institucional, com base nos direitos humanos, para a gestão de conflitos em áreas sensíveis. Tese (doutorado em Ciências Policiais de Segurança e de Ordem Pública). São Paulo: CAES, 2010.
PMESP. DIRETRIZ n. PM3-008/02/06. Normas para o Sistema Operacional de Policiamento PM. São Paulo: PMESP, 2006. Disponível em: . Acesso em: 20 fev. 2014.
REIS, Helena dos Santos. Polícia e mediação de conflitos: capacitação de policiais militares mediadores. Dissertação (mestrado em Ciências Policiais de Segurança e de Ordem Pública). São Paulo: CAES, 2009.
SANTANA, Marcelo Miranda de. A Polícia Militar do Estado de São Paulo como órgão promotor da justiça restaurativa. Dissertação (mestrado em Ciências Policiais de Segurança e de Ordem Pública). São Paulo: CAES, 2010.
SÃO PAULO. Constituição do Estado de São Paulo. Disponível em: . Acesso em: 28 abr. 2014.
SKOLNICK, Jerome H.; BAYLEY, David H. Policiamento comunitário. São Paulo: EDUSP, 2006.
TRAJANOWICZ, Robert; BUCQUEROUX, Bonnie. Policiamento Comunitário: como começar. RJ: PMERJ, 1999.



[1] Competência Residual é também conhecida como “Doutrina da Remanência” (AMORIM, ob cit., p. 93).
[2] Proteção integral é o “amparo completo”, sob o ponto de vista material e espiritual, constituindo-se em “expressão designativa de um sistema onde crianças e adolescentes figuram como titulares de interesses subordinantes frente à família, à sociedade e ao Estado”. (FONSECA, 2012, p. 15).
[3] Lazzarini (ALVARO, 1999, p. 21) define os três elementos constitutivos da ordem pública: Segurança Pública: “É o estado antidelitual que resulta da observância dos preceitos tutelados pelos códigos penais comuns e pela lei de contravenções penais, com ações de polícia repressiva ou preventiva típicas, afastando-se, assim, por meio de organizações próprias, de todo o perigo, ou de todo o mal que possa afetar a ordem pública em prejuízo da vida, da liberdade ou dos direitos de propriedade das pessoas, limitando as liberdades individuais, estabelecendo que a liberdade de cada pessoa, mesmo em fazer aquilo que a lei não lhe veda, não pode ir além da liberdade assegurada aos demais, ofendendo-a”. Tranquilidade Pública: "Exprime o estado de ânimo tranquilo, sossegado, sem preocupações nem incômodos, que traz às pessoas uma serenidade, ou uma paz de espírito. A tranquilidade pública, assim, revela a quietude, a ordem, o silêncio, a normalidade das coisas, que, como se faz lógico, não transmitem nem provocam sobressaltos, preocupações ou aborrecimentos, em razão dos quais se possa perturbar o sossego alheio. A tranquilidade, sem dúvida alguma, constitui direito inerente a toda pessoa, em virtude da qual está autorizada a impor que lhe respeitem o bem-estar, ou a comodidade do seu vive”. Salubridade Pública: "Referindo-se às condições sanitárias de ordem pública, ou coletiva, a expressão salubridade pública designa também o estado de sanidade e de higiene de um lugar, em razão do qual se mostram propícias as condições de vida de seus habitantes”.
[4] Sinergias e Respostas: Alianças Estratégicas na Prevenção da Criminalidade e Justiça Criminal.