quarta-feira, 19 de junho de 2013

O movimento - Rogério Baptistini



Ignoro as causas reais do movimento social que se espalha por São Paulo e por outras cidades. Não sou adivinho e não participo de movimentos organizados ou partidos políticos. De qualquer forma, num primeiro olhar, fica claro a força das redes sociais virtuais e a incapacidade dos partidos e demais instituições tradicionais em canalizarem as demandas que surgem na sociedade.
Também é evidente a fragilidade da cultura política liberal e democrática. Associada, talvez, a um resquício burguês e conservador, a tolerância e a disposição para ouvir o outro - aquele que mobiliza argumentos diferentes - é pequena, sobretudo pelos que se apresentam como representantes do movimento horizontal e sem líderes.
A ausência de lideranças também dificulta a prática da política e a busca do consenso. Sem ter com quem negociar, sem pautas mínimas, fica difícil o convívio e a busca pelo entendimento. Neste cenário, o confronto que só termina com a eliminação do outro é sempre uma possibilidade.
Não parece, contudo, que a maioria dos que ocupam as ruas queira o confronto puro e simples. Os manifestantes pela redução da tarifa do transporte, que viram seu movimento ser engrossado por descontentes vários, têm dado demonstrações de buscarem a saída política e não o vandalismo.
O viés romântico e anticapitalista do discurso de alguns grupos, sobretudo nas redes sociais virtuais, é outro elemento que nubla o horizonte, pois, não raro, alimenta a cultura totalitária e desqualifica a política nos termos do Estado de Direito, encarados, este e aquela, como ilegítimos.
Em um cenário que, a primeira vista, parece desalentador, sobretudo pelo caos em que a vida se transforma, é necessário imaginação, capacidade criativa e, também, firmeza na defesa de certos valores essenciais. A verdade não reside apenas nas leis e instituições, nem tampouco nas ruas e nas demandas.  Encontrar o termo adequado é o desafio para os que creem na possibilidade de uma sociedade livre, justa e democrática.
Um abraço,
Rogério Baptistini.

3 comentários:

  1. Muito bom o texto, caro professor... o movimento, ainda que sem direção, parece expressar algo que o senhor tem falado sempre com alunos e amigos: a democracia representativa no Brasil é uma piada. O descontentamento vem da percepção que os governantes não refletem o que é a sociedade brasileira, não um projeto de nação que não seja o benefício próprio. Um problema que data de 1500 e que é uma das forças motrizes de nossa história. Quando o caos arrefecer é que vamos ver se os movimentos vão, de verdade, trazer novas propostas para o país ou simplesmente repetir a velha tradição de falso radicalismo seguido por acomodação, que tantas vezes vimos em nossa história.

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  2. Parabéns Jeffinho pela postagem, esclarecedores os argumentos do ensaísta, todavia acredito que esse será um momento que deveremos viver e acompanhar de perto para um futuro posicionamento.

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  3. Flávio Haddad - Araraquara - SP21 de junho de 2013 às 11:32

    Ao contrário de alguns de seus colegas acadêmicos, especialmente aqueles que vão aos noticiário de TV fazer apologia do movimento que está colocado, responsabilizando apenas a classe política por "não ouvir as vozes das ruas", se omitindo com relação ao papel das Universidades, especialmente as públicas, o professor tem a lucidez, coragem e grandeza de pontuar questões importantes e a humildade de chamar atenção para que reconheçamos que nenhum indivíduo ou instituição tem a resposta pronta para analisar os fatos recentes relacionados as manifestações noticiadas. Parabéns !

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