quarta-feira, 29 de setembro de 2010

As Degradações Ambientais e sua Responsabilização - Breves comentários


Responsabilidades pelos danos ambientais - Uma visão muito resumida.

Jucovsky [1] afirma que a “Lei 6.938/81, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, introduziu uma visão holística da proteção ao meio ambiente como um sistema ecológico integrado e autônomo, ou seja, como bem jurídico”. O cidadão e o Poder Público, constitucionalmente, tem a obrigação de proteger o meio ambiente (conforme já estudado). Surge, portanto, a questão da responsabilização pela prática dos danos perpetrados ao meio ambiente. Jucovsky [2] ensina:

O cidadão e o Poder Público têm o dever de defender e conservar o ambiente, e não apenas o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado. Daí que a ‘responsabilidade pela proteção ambiental e defesa da ecologia é do Poder Público e do particular. Do que se conclui que o Estado é co-responsável pelos danos daí advindos, podendo ser chamado a compor prejuízos individuais ou coletivos’. Se um particular ou uma empresa causar poluição e o Poder Público não exercer o seu poder de polícia fiscalizatório, mesmo existente alvará de funcionamento ou vistoria prévia, o Estado poderá a vir responder de forma solidária, com o particular, pela sua omissão, com direito de regresso contra o poluidor”.

Por dano ambiental se entende a “lesão a interesse alheio (pessoa física ou jurídica, grupo ou coletividade) tutelado juridicamente, isto é, o dano ocorre quando há modificação ou diminuição o bem que propicia a satisfação de um interesse” [3]. Por sua vez, o dano ambiental abrange as “modificações negativas no meio ambiente, ou os efeitos na saúde dos seres humanos e em seus interesses, daí poder incidir tanto no patrimônio ambiental da coletividade como também nos interesses e direitos de determinadas pessoas” [4]. A Lei n. 6938/81 trata da degradação da qualidade ambiental e da poluição.

A responsabilização de pessoas físicas e jurídicas nas esferas administrativa, civil e criminal está prevista no art. 225, §3º da CF, salientando seu caráter solidário e compartilhado. Inicialmente, portanto, faz-se necessário diferenciar os institutos, salientando, em meu ponto de vista, o que apresenta maior peculiaridade.

Responsabilização Civil pelos Danos Ambientais

A responsabilidade civil implica na indenização pela prática de danos morais ou patrimoniais, dolosos ou culposos, de obrigação legal ou contratual, ou imposta por lei. O prejudicado pelo dano pode exigir do autor uma prestação, consistente na reparação dos danos causados. Assim, esta sanção tem natureza compensatória. No caso da reparação civil, aplica-se o conceito da “responsabilidade objetiva” (art. 14, § 1º da Lei n. 6938/81) com base no princípio do poluidor-pagador. Neste caso, Jucovsky [5] ensina:

Cuida-se, portanto, da incidência da teoria da responsabilidade civil objetiva pelo risco criado e pela reparação integral, com vistas à socialização do dano, ou seja, toda a pessoa que em sua atividade causar prejuízo ao ambiente e/ou a terceiros é responsabilizada pelo risco, não sendo necessária a demonstração da culpa do agente, mas, somente, o nexo de causalidade entre a conduta e o resultado”.

Em relação ao nexo de causalidade, essencial neste caso, o STJ se pronunciou [6]:

A imputação de responsabilidade civil, objetiva ou subjetiva, supõe a presença de dois elementos de fato (a conduta do agente e o resultado danoso) e um elemento lógico-normativo, o nexo causal (que é lógico, porque consiste num elo referencial, numa relação de pertencialidade, entre os elementos de fato; e é normativo, porque tem contornos e limites impostos pelo sistema de direito).

Importante também lembrar que a licitude da atividade desenvolvida não ilide a responsabilidade pelos danos.

Responsabilização Administrativa por Danos Ambientais

As infrações administrativas ao ambiente estão consolidadas na CF (art. 225, §3º), nas leis infraconstitucionais (em especial nas Leis n. 6938/81 e 9605/98, onde encontra sua definição). O rol de penas administrativas está previsto no art. 72 da Lei n. 9605/98.

Responsabilização Penal por Danos Ambientais

Inovação jurídica surge com a previsão constitucional de colocar a pessoa jurídica no pólo ativo na prática de um crime ambiental. Rocha [7] adverte:

Regulamentando o parágrafo 3º do art. 225, a Lei 9605/98 materializou o entendimento de que a disposição constitucional não tratou de conseqüências respectivas para a lesão ambiental, mas cumulativas, de modo que a pessoa jurídica pode ser responsabilizada penal e administrativamente, independente da obrigação de reparar os danos causados. A mudança de paradigma, certamente, encontrará a resistência dos conservadores. Mas importa lembrar que cabe ao legislador definir os contornos da política criminal a ser implantada em nossa sociedade. Se o legislador, legitimamente, fez opção por responsabilizar a pessoa jurídica não podem os operadores do direito inviabilizarem essa opção política. Uma tal resistência é manifestamente ilegítima.

Lecey [8] ensina que os mais graves atentados ao meio ambiente são causados pelas empresas, pelos entes coletivos, pelas pessoas jurídicas. Esta “complexidade pode levar a irresponsabilidade organizada dos indivíduos”. Benjamin [9], neste sentido, explica que “a diluição de muitas condutas, com freqüência no interior dos grandes conglomerados industriais e comerciais traz dificuldade na persecução penal”.

Souza [10] adverte, neste sentido:

A doutrina não é pacífica. De um lado os que são radicalmente contrários – societas delinquere non potest – cujos principais argumentos repousam na falta de capacidade ‘natural’ de ação e carência da capacidade de culpabilidade.

O art. 3º da Lei 9605/98 indica que as “pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício de sua entidade”. Assim, doutrinadores entendem que a responsabilização penal da pessoa jurídica passa pela análise de quatro condicionantes: interesse ou benefício por parte da empresa; a infração tem que ter sido praticada por decisão de seu representante legal, por decisão de seu representante contratual e por decisão do órgão colegiado [11]. As penas aplicadas (previstas na lei 9605/98) devem ser cumpridas pelo representante da empresa (ex.: sócio).

Interessante ainda o artigo publicado pelo promotor de justiça (MPSP) Bolque [12]:

A pena também não atingirá todos os integrantes do ente coletivo, posto que por força do que dispõe o art. 21 da Lei de Crimes Ambientais, a pena será de multa, restritiva de direitos ou prestação de serviços a comunidade. Não se fala ali em pena privativa de liberdade, posto que é óbvio que nesta modalidade de pena deve ser respeitada a sua individualização, não sendo possível a pessoa jurídica receber tal penalização.

O mesmo promotor [13] cita o entendimento de Milaré, que considero importante e esclarecedor:

O intento do legislador, como se vê, foi punir o criminoso certo e não apenas o mais humilde ou “pé-de-chinelo do jargão popular. Sim, porque, via de regra, o verdadeiro delinqüente ecológico não é pessoa física, o quitandeiro da esquina, por exemplo, mas a pessoa jurídica que, quase sempre, busca o lucro como finalidade precípua, e para tal pouco interessam os prejuízos a curto e longo prazos causados à coletividade, bem como pouco importa que a saúde da população venha a sofrer com a poluição.

Aponta um exemplo esclarecedor [14]:

Um exemplo prático pode ser dado: recentemente a Polícia Florestal autuou uma Destilaria na região de Ourinhos efetuando desmatamento em área de preservação permanente com o nítido propósito de ali plantar cana-de-açucar.
Se não houvesse a responsabilidade penal da pessoa jurídica, a questão seria resolvida no arquivamento do inquérito policial, posto que os funcionários que ali estariam praticando em tese o crime, assim agiram por determinação superior, em nítido caso de obediência à ordem hierárquica superior. Como poderiam negar a realização da “tarefa” de “limpeza da área” para o plantio da cana? Se assim fizessem, a resposta seria a demissão.
Mas como agora há a responsabilidade penal da pessoa jurídica, a empresa foi devidamente responsabilizada, sendo que o representante legal afirmou textualmente que a prática é comum, por determinação e deliberação do órgão diretivo e em claro benefício da entidade. Enquadra-se, portanto, perfeitamente à hipótese do art. 3º.




[1] JUCOVSKY, Vera Lucia R.S. Responsabilidade das empresas por passivos ambientais. 6º Congresso Internacional de Direito Ambiental. São Paulo, 2002. p. 265.
[2] Idem, p. 267.
[3] Idem, p. 269.
[4] Ibidem.
[5] Idem, p. 271.
[6] Recurso especial n. 719.738-RS, DJe 22/09/2008.
[7] ROCHA, Fernando A. N. Galvão da. Responsabilidade penal da Pessoa Jurídica. 6º Congresso Internacional de Direito Ambiental. São Paulo, 2002. p. 134.
[8] LECEY, Eladio. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: efetividade na realidade brasileira. 6º Congresso Internacional de Direito Ambiental. São Paulo, 2002. p. 117.
[9] BENJAMIN, Antonio apud LECEY, Eládio. Responsabilidade penal da pessoa jurídica: efetividade na realidade brasileira. 6º Congresso Internacional de Direito Ambiental. São Paulo, 2002. p. 117.
[10] SOUZA, Elaine Castelo Branco. Responsabilidade criminal da pessoa jurídica por ato lesivo ao meio ambiente. 6º Congresso Internacional de Direito Ambiental. São Paulo, 2002. p. 361.
[11] DALL’AGNOL, Aline de Sant’Anna.  Responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais. Congresso Internacional de Direito Ambiental. São Paulo, 2009. p. 153.
[12] BOLQUE, Fernando Cesar.  A Responsabilidade Penal da pessoa jurídica e a lei 9099/95. Anais do 3º Congresso de Meio Ambiente do Ministério Público de São Paulo. Ubatuba, 1999. p. 120.
[13] MILARÉ, Edis apud BOLQUE, Fernando Cesar. Ob. cit., p. 122.
[14] BOLQUE, ob. cit., p. 122.

domingo, 26 de setembro de 2010

Qualidade Ambiental do Estado de São Paulo - 2010


PAINEL DA QUALIDADE AMBIENTAL DE 2010

Publicado pelo Governo do Estado de São Paulo, por meio de sua Secretaria de Meio Ambiente, em 2010, apresenta vários indicadores adotados pelo Executivo Paulista na busca de um meio ambiente saudável e sustentável.
Relata, de forma bem resumida, 21 indicadores básicos, na seguinte conformidade:
·         Qualidade do ar;
·         Qualidade da água;
·         Saneamento ambiental;
·         Biodiversidade;
·         Mudanças climáticas;
·         Conservação do solo;
·         Produção e consumo – Pegada ecológica;
·         Agenda ambiental descentralizada;
·         Fiscalização ambiental.
O indicador que nos interessa, nesta artigo, é o relativo a fiscalização ambiental, mormente que retrata a eficiência das atividades da Polícia Militar Ambiental do Estado.
O indicador de prevenção ambiental, construído pelo Comando de Policiamento Ambiental da Polícia Paulista impressiona, pois retrata a “aferição de algo intangível”, ou seja, a prevenção.
É construído com base em boletins de ocorrência ambientais que resultaram em autos de infração, ou seja, a atividade policial comparada com a ocorrência efetiva de uma degradação ambiental.
É necessário, entretanto, esclarecer alguns aspectos que não constam na edição do painel. O indicador mostra a evolução da proteção de vegetação nativa no Estado de São Paulo, que foi suprimida ilegalmente. Computou-se apenas as áreas de vegetação nativa secundária a partir do estágio inicial de regeneração, ou seja, desprezou-se a supressão de grama, pasto sujo etc., e, tampouco, a supressão de vegetação em APP pelo pisoteio de gado (fatos que em anos anteriores era observado e computado).
Questão relevante que deve ser considerada pelo leitor, é que houve um aumento de quase 50% dos autos de infração por supressão de mata nativa, quando comparado os anos de 2008 e 2009 (de 5.178 para 10.250 AIA). Ocorre que, embora não constando na publicação do painel, as áreas degradadas são pequenas (evidencia-se este fato com a publicação do inventário florestal do Instituto Florestal). Mais autos de infração, mas áreas degradadas menores, ressaltando que as pesquisas feitas por satélite mostraram um aumento na cobertura vegetal do Estado de 13 para 17,5%, o que significa um aumento de 800.000 há de matas.
Nesta análise de prevenção, verifica-se uma pequena diminuição na confecção de boletim de ocorrências ambientais, embora exista um aumento de autos. Num primeiro momento poderíamos pensar que trabalhamos menos, portanto, medimos uma menor área degradada. Não formar este juízo em face da adoção de novos mecanismos de atuação e do uso de tecnologia. Na verdade, estamos mais eficientes.
Seria mais agradável ao leitor que se apresentasse um mapa com a indicação do aumento da cobertura vegetal, o que propiciaria uma compreensão mais simplificada do leitor.
Mesmo assim, é louvável e digna de elogios a construção deste indicador e a participação do policiamento ambiental paulista na preservação das matas nativas.

Fonte: Inventário Florestal - 2005

sábado, 25 de setembro de 2010

Coeficiente Eleitoral


Achei interessante esta imagem que recebi em meu correio eletrônico. Mostra exatamente uma face oculta dos votos dos eleitores. É o coeficiente eleitoral.
Vamos dar uma boa olhada e pensar sobre o fato.

Morto ou vivo? - Um "causo verdadeiro"


CONTOS VERDADEIROS

Sempre gostei de livros. Sou um leitor voraz. Adoro bibliotecas e uma de minhas paixões é a pesquisa. As vezes encontro obras raras, com conteúdos extremamente interessantes.
Foi o que aconteceu na nesta manhã, dia comemorativo do Rio Tietê. Estava garimpando uns livros, quando deparei-me com uma capa repleta de imagens de pessoas com uniformes policiais. “Fardas” antigas, sendo que terminei por me lembrar dos meus 30 anos de serviço, pois algumas delas envergara quando entrei nas fileiras da PM paulista. Chega de memórias pessoais, pois o foco deste artigo é outro.
O livro, publicado pela seção de criação e arte da 5ª EM/PM (Seção do Estado-Maior responsável pelo relacionamento com o público até algum tempo atrás), em 1977, quando o símbolo da Instituição ainda era o “PM Zito” (saudades, pois ele sim era comunitário). Quem conheceu se lembra, aquele PM com o braço direito acenando um cumprimento respeitoso, com um largo sorriso no rosto e na mão fraca (esquerda), como que em respeito ao cidadão, segurava uma flor. Bons tempos!
O livro, finalmente, tem o sugestivo título de “História que nós vivemos” e relatava contos, como descrito na contra-capa, “de fatos reais”. O prefácio, do então Comandante Geral, Coronel Francisco Batista Torres de Melo, escrevia:
Soldado de Floreal, seu presente é a certeza de nosso futuro. Sua fé é que escreve a História desta Polícia Militar, que há de ser enriquecida sempre, enquanto homens de sua têmpera viverem o seu dia-a-dia, enquanto alguém com a sua fé construir o tijolo que edifica sua grandeza.
É a vida do policial, que anônimo constrói uma sociedade mais justa.
Mas, vamos logo ao que interessa. Folheando o livro, entre os vários contos, encontrei um com o título “O morto vivo”. Evidente que me chamou a atenção. Mais surpreso ainda fiquei quando vi o autor, um grande amigo, o então 3º Sargento Delcir Getúlio Nardo.
Uma pérola. Não posso, portanto, guardar esta história somente para mim, principalmente neste mundo globalizado. Assim, tomo a liberdade de transcrever a história desse amigo.

O MORTO VIVO
Quando exercia as funções de comandante do destacamento policial de Araçatuba, atual pelotão de policiamento ostensivo, num sábado, em meados de 1970, após efetuar a ronda nos serviços de policiamento, retornei a sede da Unidade, por volta das 23:00 horas. Deparei com um cidadão dizendo, apavorado, que o carro de seu filho havia sido furtado na cidade de Andradina-SP, na semana anterior e que o rapaz, em perseguição, já havia passado pelas cidades de Dracena e Presidente Prudente, além de várias outras da região da Paulista e Sorocabana. Soubera, naquele dia, que o carro fora visto em Araçatuba.
No momento todas as viaturas estavam a atender ocorrências, sem condições de comunicação por deficiência de rádios. Diante de tal situação, juntamente com dois soldados do destacamento, Hamilton de Almeida Santana e Fausto Loureiro, ocupando o veículo do pai da vítima, saímos em patrulhamento e não demorou muito para que o carro fosse localizado. Estava estacionado defronte a um bar, freqüentado por elementos suspeitos.
Feito o reconhecimento do veículo pelo pai da vítima, adentramos ao bar e, em um dos reservados, havia três casais tomando cerveja.
Todos ali presentes eram desconhecidos. Após fazer o cauteloso porte de armas, perguntei a eles quem ocupava aquele veículo estacionado defronte o bar. Disseram desconhecer e, como estivessem sem documentos, detive todos por suspeita. E, sem meios para o transporte, pedi a um civil que telefonasse ao controle, solicitando uma viatura para a condução dos presos.
Enquanto aguardávamos, ouvi um ruído nos fundos da casa. Determinei ao soldado Hamilton fosse verificar. Nesse momento, aproveitando do desfalque na vigilância, um dos detidos, moreno e forte, saiu em desabalada carreira, ouvindo-se em seguida, um disparo de arma de fogo. Estranhamos, pois aquelas pessoas haviam sido rigorosamente revistadas. O tiro, porém, ficamos sabendo depois, fora dado por um indivíduo, que já havia sido detento na cadeia de Araçatuba e que estava em companhia do que tentara evadir-se.
Não foi difícil alcançar o fugitivo. Difícil foi dominá-lo, pois era um elemento bastante forte e eu não podia contar com a ajuda dos demais policiais. Eles vigiavam os outros detidos. Após alguns minutos de luta, bati com a cabeça dele no muro que ele desejava saltar, provocando-lhe um pequeno corte e desmaio.
Algemados, determinei aos dois PMs que os conduzissem à delegacia de polícia, em uma Kombi particular. Eu fiquei nas proximidades do carro furtado, para a eventualidade de que outro retornasse para buscá-lo.
Na delegacia, apurou-se tratar de marginal de alta periculosidade. Confessou que ocupava o veículo furtado, mas que a chave estava como que dera o tiro enquanto fugia. Revistado, encontramo-la na bainha de sua calça.
Os outros dois e as três mulheres foram liberadas.
Com a confirmação, logo depois, que o autor do disparo havia se evadido, desloquei-me, até a delegacia de polícia, conduzindo o carro furtado.
Houve uma autuação em flagrante delito e, em seguida, conduzimos o autor do furto ao pronto-socorro para receber curativos no ferimento do choque contra o muro.
Na própria delegacia de polícia, o ladrão já comentou que iria “acertar contas” comigo, assim que pudesse.
Depois de recolhido na cadeia de Andradina, para onde foi levado, continuou propalando a sua idéia de vingança. Chegou, inclusive, a prestar queixa em juízo, alegando que a bala que tinha na coxa, resultara de um disparo efetuado por mim, no ato da detenção. O juiz daquela cidade determinou investigações a respeito. Fui intimado para depoimentos. Nada, porém foi provado. A bala era resultado de antigo tiroteio e, nas peças iniciais de sua prisão, somente constava o ferimento no couro cabeludo.
Em 10 de fevereiro de 1971, fui alertado através de um telefone do cabo Acialde, de Andradina, que o preso fora liberado e comentou que viria a Araçatuba, “acertar umas contas”. O cabo ficou preocupado pelo motivo do preso já ter comentado, outras vezes, sua idéia de vingança.
Na noite do dia seguinte, quase todo o efetivo do destacamento encontrava-se empenhado na busca do marginal que havia assassinado o soldado Dirceu Gonçalves do Santos. Nessa noite ele chegou a Araçatuba. Procurou-me na cidade e não me encontrou porque eu estava na referida diligência. Ele foi até a casa de uma das testemunhas do fato e que bebia com ele no ato da detenção. Disse-lhe para se preparar, pois iria acertar as contas comigo e depois voltaria para acabar com ela, caso não concordasse e viajar em sua companhia.
Tão ousado, chegou a procurar-me através do cabo encarregado de uma viatura de RP.
Depois disso o indivíduo ausentou-se e, dias após, chegava uma mensagem (rádio) para a delegacia de Araçatuba, comunicando que o mesmo havia sido assassinado numa cidade de Minas.
Começaram então algumas investigações pela justiça de Araçatuba, intimando, por várias vezes, aquela mesma testemunha já citada. A mesma quis saber o motivo de somente ela ser intimada e não outras que também presenciaram os fatos. Inquirida se sabia por que o marginal tinha vindo a Araçatuba, respondeu que o principal motivo era vingar-se do policial que o havia prendido e dela que, como testemunha, o havia prejudicado.
Na ocasião perguntaram-lhe também se eu pretendia alguma coisa contra o marginal, como represália às ameaças que ele me fazia. Respondeu negativamente. Perguntada ainda se sabia que o marginal havia sido assassinado e que a suspeita recaía sobre mim, respondeu negativamente a ambas as questões.
A testemunha procurou-me dias depois para colocar-me a par da situação. Antes, porém, de qualquer providência de minha parte, o marginal foi visto na mesma cidade de Araçatuba, ocupando um veículo furtado. Constatava-se assim que, a mensagem, “vinda” de uma das delegacias do estado de Minas Gerais comunicando sua morte, era fictícia.
Novamente, algum tempo depois, chegava outra mensagem, comunicando que ele fora morto quando tentava furtar uma camioneta, na cidade de Goiânia. Dessa vez também a notícia era falsa. O autor da mensagem era o próprio irmão do criminoso.
O marginal usava essas artimanhas para, admitida a hipótese de que estava fora de circulação, desviar as suspeitas e agir livremente, sem ser molestado pelas autoridades.
Consta que no final de 1972 ou início de 1973 o referido marginal foi morto, com uma rajada de metralhadora, quando contrabandeava na fronteira do Paraguai e, já que gostava de morrer para viver melhor, essa notícia também pode ser considerada duvidosa.
O que valoriza este relato não é em si a prisão do marginal, realizada em estrito cumprimento do dever, nem as ameaças a que todo policial esta sujeito, mas a importância da evidência de uma prova, pois, visto o marginal dirigindo um automóvel como foi, o mantenedor da ordem deixou de ser o principal suspeito de sua morte...”

Parabéns Getúlio. Belo conto. Entretanto ainda fica uma dúvida: será que ele esta morto?

PS: Nosso amigo Getúlio ainda mora em Araçatuba e esta em franca atividade política. Espero que ele possa ler e relembrar-se deste texto, contando para seus filhos, netos e bisnetos. Valeu amigo!